O TRIBUNAL DAS MÍDIAS SOCIAIS E O JULGAMENTO DAS AÇÕES DIRETAS DE CONSTITUCIONALIDADE 43, 44 e 54
No dia 07 de novembro de 2019, como largamente divulgado em todos os veículos de comunicação deste país, o Supremo Tribunal Federal, julgou por 6 a 5 votos, pela constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, perante a Constituição Federal.
Contudo, após a decisão , que possui um caráter importantíssimo para o cidadão brasileiro, milhares de pessoas, passaram a emitir suas opiniões, na grande maioria dos casos, embasadas pelas inverdades divulgadas nas mídias do nosso país.
Debater e discutir, expor pensamentos e opiniões, faz parte do Estado Democrático de Direito, é um direito fundamental, inclusive previsto na nossa Constituição Federal de 1988. No entanto, estamos sendo utilizados como massa de manobra, para disseminar inverdades ou fake news.
Todos nós estamos sujeitos a serem vítimas das chamadas fake news , bem como de sermos propagadores das referidas, o que é gravíssimo. Um número considerável de pessoas, passaram a utilizar as redes sociais, com discursos de ódio, de cunho político-partidário, e bombardearam seus status e stories, informando que “assassinos” e “estupradores” estariam na rua, após a decisão do Supremo Tribunal Federal.
A minha indagação , é simples e objetiva, será que o cidadão brasileiro, tinha pleno conhecimento do que estava sendo julgado, ou preferiu reduzir a temática em oportunidade para conceder a liberdade aos presos da operação Lava Jato ? O que viu-se foi um debate, resumido em “lulistas” e “bolsonaristas”, eivados de uma cegueira sem precedente, as pessoas passaram a atribuir um discurso político acerca da decisão.
No Brasil, a maioria da população carcerária, encaixava-se no rol cautelar( prisão preventiva), assim, os agentes de crimes, considerados violentos ou hediondos, eram presos preventivamente e permaneciam encarcerados até a condenação, com trânsito em julgado, ninguém reclamava. Alguns desses, poderiam até ser absolvidos, no entanto, esse é o encargo de se autorizar a prisão cautelar.
Sendo assim , é possível afirmar que após a decisão do STF, o número de presos libertados aumentaria, inclusive dos criminosos de alta periculosidade? A resposta é não, os presos considerados perigosos, praticantes de crimes violentos e hediondos, permanecem presos por restarem presentes os requisitos da prisão preventiva. Logo, ao não permitir o cumprimento da pena após o julgamento de segunda instância, essas pessoas, jamais poderão ser colocadas em liberdade sob o fundamento exclusivo da decisão comentada.
É importante frisar, que existem os agentes que estão(vam) presos, dito não perigosos, apenas para cumprir a pena, determinada em sentença penal condenatória, que havia sido julgada pela segunda instância. Ou seja, não se encontravam presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, o motivo da prisão era exclusivamente para cumprimento da pena, após sentença já julgada pelo segundo grau.
Logo, quem é réu primário, sem antecedentes, sem periculosidade, não necessita “cumprir pena” antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Tal fato, na verdade constitui um direito fundamental, conforme demonstraremos abaixo.
Dessa forma, pretendemos expor brevemente, a conteúdo da decisão, sob a ótica estritamente jurídica. O artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal, afirma: “ Ninguém será considerado culpado até o transito em julgado de sentença penal condenatória”. No mesmo sentido, o artigo 283, do Código de Processo Penal: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgada ou , no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”. (grifo nosso).
Salienta-se, mais uma vez, que constitui mentira, que a decisão de 07 de novembro de 2019, colocará nas ruas uma vastidão de meliantes violentos. Logo, quem é considerado violento, tem maus antecedentes, permanece preso. Quem não é, aguarda solto, o trânsito em julgado da decisão condenatória.
É importante destacar, que o STF, “não reconheceu” , fez exatamente aquilo que lhe fora incumbido. O Supremo Tribunal Federal, é guardião da Constituição Federal, é deve sempre segui-la e pugnar pelo seu respeito. Ademais, o Supremo Tribunal Federal, deve antes de mais nada, respeitar o legislador, que assim desejou editar aquela previsão normativa, na Constituição Federal, com reflexos no Código de Processo Penal.
Outrossim, não dispõe o pretório excelso competência para legislar nesse país. É sabido por todos nós, que a competência para legislar é do Poder Legislativo, qualquer modificação na Constituição Federal ou Código de Processo Penal, deverão ser feitas pela via adequada, Congresso Nacional.
Outro ponto, devemos destacar, é que o STF não pode jamais, ser um Tribunal, norteado pela opinião pública, a aplicação da Justiça, não poderá jamais isto como embasamento para suas decisões.
Por fim, se você está de fato preocupado, se esta decisão colocará criminosos de alta periculosidade nas ruas, pode se acalmar, que jamais isso será possível, quem está preso por perturbar a sociedade, ter maus antecedentes, irá permanecer preso.
Por decorrência lógica, aqueles que não ofereciam riscos à sociedade, e estavam presos única e exclusivamente, para cumprir pena, de decisão condenatória julgada pelo segundo grau, será posto em liberdade, e aqueles que estão soltos, não poderão ser presos ( desde ausentes os requisitos da prisão preventiva, o que envolve periculosidade, maus antecedentes, fustigação da aplicação da lei penal) antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Ressaltamos, que nada disso será automático, cada caso será apreciado pelo Poder Judiciário.
Forte abraço.
Carla Teixeira, é advogada inscrita na OAB/BA. Membro da Comissão de Direito Criminal da OAB/BA Subseção Juazeiro/BA.