Depois de uma campanha nas redes sociais criada por grupos religiosos contra uma pintura no muro do instituto cultural Goethe-Institut, em Porto Alegre, a imagem amanheceu com marcas de vandalismo na manhã da última terça-feira (1). A ilustração amanheceu pichada cobrindo o rosto que representava Jesus Cristo, que retratava a cabeça do filho de Deus em uma bandeja. Também foram pichadas frases como “ele ressuscitou”.
Uma nova pichação foi feita, nesta quarta-feira (2), com tinta azul, por cima da anterior, com a inscrição “ai, meu deuso“. Ainda Não se sabe quem teria feito as pichações que cobriram o desenho. A pintura faz parte da exposição “Pixo/Grafite: realidades paralelas” com obras dos artistas Amaro Abreu, de Porto Alegre, e Rafael Augustaitiz, de São Paulo.
A imagem que sofreu com as pichações é de Rafael Augustaitiz, conhecido pelas polêmicas. Em 2008, ele pichou uma instalação da 28ª Bienal de São Paulo, em São Paulo. No mesmo ano, foi expulso da Faculdade de Belas Letras depois de pichar o prédio da instituição. Mas foi convidado para expor na Bienal de 2010.
Após um abaixo-assinado de repúdio promovido pela organização religiosa Centro Dom Bosco que o grafite foi pichado cobrindo o rosto da imagem. Em 2017, o Centro Dom Bosco também fez ataques à exposição Queermuseu, do Santander, que acabou fechada. A organização defende a criação de um “estado católico” e o grupo já processou os comediantes do Porta dos Fundos.
O Dom Bosco afirma que o grafite de Augustaitiz é um crime de vilipêndio previsto no artigo 208, do Código Penal. Entretanto, a lei fala sobre “vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”. Não é o caso do grafite. Apesar de fazer referência à imagem de Cristo, não é uma escultura ou quadro mantido no interior de uma igreja, por exemplo.
O artista já fez outras exposições e pichações em edifícios em que simboliza o “mal” para “criar uma cidade fantasma, invertida, refletida no espelho do demônio” segundo Laymert Garcia dos Santos, curador da exposição no Goethe. Por isso, o texto do abaixo-assinado do Dom Bosco chama o autor de “satanista”. Augustaitiz utiliza símbolos como um pentagrama invertido e o “666” nos seus últimos trabalhos.
O artista de 34 anos disse que “as instituições têm oprimido a imaginação e desonrado o intelecto, degradando as artes a fim de estupidificá-la e promover a escravidão espiritual, a propaganda para o estado e o capital, reações puritanas, lucros injustos, mentiras e arruinamentos estéticos”.
O Goethe-Institut emitiu uma nota na tarde desta quarta-feira (2) dizendo que “está analisando as manifestações recebidas em decorrência da pintura do muro de sua sede”. Dias antes, o instituto divulgou uma nota dizendo que estava recebendo “mensagens de ódio”. “Em nenhum momento foi intenção do projeto ou do Instituto ofender sentimentos religiosos. Respeitamos todas as crenças, manifestações e liberdade de expressão. O Goethe-Institut, como instituição cultural presente em mais de 90 países, dialoga intensamente com as sociedades locais e fomenta a discussão, participação e atuação artística e cultural. Lamentamos manifestações que incitem o ódio e as ameaças à liberdade de expressão”.
Um grupo protestou em frente ao Goethe defendendo a exposição. Por sua vez, a Arquidiocese de Porto Alegre repudiou a obra falando que “a polêmica e as reações que estão ocorrendo diante da infeliz imagem são resultado da falta de respeito pelo senso religioso, pelos valores cristãos e pela história desta cidade. Se pretendemos evitar polarizações e superar a violência, precisamos garantir um diálogo respeitoso e reverente pelo outro”.