Movidos pelo ímpeto de mudança, em 2006, os baianos encerraram 16 anos de sucessivos mandatos carlistas e deram uma vitória inédita ao Partido dos Trabalhadores. De forma surpreendente, ainda no primeiro turno (com 52,89% dos votos), Jaques Wagner se elegeu derrotando o grupo comandando pelo então senador Antônio Carlos Magalhães (1927-2007).
Coincidentemente, exatos 16 anos depois, desta vez é o PT que parece encerrar seu ciclo à frente da quarta maior federação do país. Ao que tudo indica, a legenda vai abrir mão de indicar um nome e apoiar o senador Otto Alencar (PSD) na disputa ao Palácio de Ondina, em 2022.
A costura tem sido feita pelo ex-presidente Lula, na tentativa seduzir Gilberto Kassab, presidente do PSD, para sua chapa nacional.
A proximidade do fim da ‘era petista’ na Bahia possibilita uma análise mais profunda dos quatro mandatos consecutivos emplacados pelo partido ao longo destes anos — Wagner duas vezes (2007-2010 e 2011-2014) e Rui Costa outras duas (2015-2018 e 2019-2022).
No poder com Wagner, o PT aproximou de partidos como PT, PV, PPS, PCdoB, PTB, PMN e PMDB, além de abrir um diálogo mais democrático com a oposição.
“O governo Wagner gerou um amplo arco de alianças que deu condições de ocupação da máquina estatal em substituição às forças carlistas, que, em parte, migraram de lado para continuarem governistas. As maiores conquistas estão no âmbito do ambiente de pluralismo político e na capacidade governativa de pensar uma agenda de desenvolvimento para a Bahia”, o pontua cientista político Cláudio André.
“Wagner entendeu o poder persuasivo desse arranjo, acoplou a Bahia a essa gramática e mandou ver. Compreendeu também que, no caso da Bahia, cabia continuar batendo também na tecla da mudança forte, confrontando os métodos autocráticos do carlismo antigo, mas assimilando a flexibilidade do carlismo dos anos 90, ferramenta importante para cooptar seu espólio”, diz o professor da Ufba Paulo Fábio Dantas, doutor em ciência política.
Na área de execução de grandes obras, os feitos são inúmeros. Em Salvador, teve a inauguração da Via Expressa, da Arena Fonte Nova, Linha Azul e Linha Vermelha e o projeto do VLT do Subúrbio e a porte Salvador-Itaparica — ambas ainda na fase de execução. Após 14 anos parado, o Metrô da capital baiana saiu do papel. O sistema de transporta, inaugurado em 2014, transporta 220 mil pessoas por dia.
No interior, um novo aeroporto foi construído em Vitória da Conquista e pontes trataram de aproximar Ilhéus de Pontal, além de Barra de Xique-Xique. Foram entregues ainda 15 mil quilômetros de estradas recuperadas.
“O forte do PT são as grandes obras. A Via Expressa, a construção de estradas, a modernização de aeroportos no interior. São pontos positivos na agenda que o PT trouxe”, pontua o historiador e professor do Departamento de História da UFBA, Carlos Zacarias.
Ao longo dos anos, o governo também descentralizou a saúde, com a ampliação da oferta de serviços de média e alta complexidade no interior. Serão 840 unidades Básicas de Saúdes (UBSs), 16 hospitais, 79 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e 26 policlínicas até o final de 2022.
ESTREMECIMENTO COM OS TRABALHADORES
Se por uma lado, o PT garantiu com a evolução de grandes obras o crescimento econômico do estado, viu ruir a relação justamente com um segmento fundamental da legenda: os trabalhadores.
“O grande problema do PT foi sua relação com os trabalhadores de um modo geral. Jaques Wagner enfrentou, em 2007, uma grande greve de servidores públicos, de professores das universidades federais e de professores da educação básica. E ainda mais dura que a greve de 2007, foi a de 2012: dos policiais e dos professores. O tratamento com os trabalhadores não foram aqueles prometidos”, frisou Zacarias.
Ainda assim, Wagner encerrou seu governo com ampla aprovação. De acordo com pesquisa Ibope divulgada em 2014, no último ano do seu governo, o petista tinha uma avaliação que ia de ótima a regular por 71% dos baianos.
Seu candidato ao governo da Bahia, Rui Costa, ex-secretário da Casa Civil, venceu as eleições em primeiro turno com 54% dos votos válidos, contra 37% de Paulo Souto (DEM), garantindo a continuidade do PT no governo baiano.
“A eleição de Rui no primeiro turno foi uma grande surpresa. De um lado tem a boa avaliação que Wagner colheu, a parte esse desgaste com os servidores públicos. A aliança do PSD de Otto Alencar e a aliança com o PP de João Leão fizeram com que muitas lideranças estivessem nas franjas do petismo e foi isso que assegurou a vitória”, explica Zacarias.
No governo Rui, o processo de entrega das grandes obras de estrutura avançou, o que lhe garantiu o apelido de “correria”. Diferente de Wagner, que surfou em um período de força do PT nacional, Rui construiu seu nome em um período de baixa da legenda — com os desgastes da gestão de Dilma Rousseff (2010-2016) e o início da Operação Lava Jato.
“A petetização da Bahia contemporânea implicou, durante o segundo governo Lula, no deslocamento do centro decisório da política estadual para o plano nacional. Foi o auge de Wagner. A crise do PT retornou o eixo decisório para o plano estadual e, aí sim, foi a vez de Rui Costa dar as cartas, encarnando o mandachuva que foi o ACM ancestral”, diz Paulo Fábio.
Como aspectos negativos, na gestão Rui Costa a Bahia teve baixo desempenho das escolas estaduais, além de passar a liderar o número de mortes violentas do Brasil. A Bahia tem, ainda, 1,1 milhão de desempregados e outros 887 mil desalentados.
Durante a pandemia da Covid-19, no entanto, em um embate aberto com o presidente Jair Bolsonaro (PSL), o governo adotou medidas duras para frear o crescimento do vírus, como a obrigatoriedade do uso de máscaras e o fechamento do comércio, além do trato republicano com o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (UNIÃO) — maior adversário nas eleições de outubro.
Próximo de deixar o mandato — caso saia candidato ao Senado tem até o dia 31 de março para se desincompatibilizar —, Rui Costa tem 79% de avaliação positiva do seu governo. Os números são do Instituto Opnus, contratado em janeiro pelo Grupo Metropole. A avaliação completamente negativa do governo (ruim ou péssima) totaliza apenas 18%.